O vídeo da fantástica “esculachada” de Theresa
May[1], atual primeira ministra
do governo britânico, sobre o líder do partido dos Trabalhadores no Parlamento
é sintomático se levarmos em consideração as acaloradas discussões recentes
sobre a imigração. Existem dois lados da questão que é necessário tratar se se
quiser ter um debate sério a respeito do assunto.
A fala da primeira ministra revela um problema
fundamental que envolve a discussão sobre o fechamento de fronteiras a
estrangeiros e refugiados. Este problema é posto em termos claros por Roger
Scruton, em sua obra Como Ser um
Conservador[2].
Publicado ainda em 2014, a obra já parecia antever o fenômeno Brexit: a
abertura das fronteiras e a submissão do Reino Unido a tratados internacionais
ditados por burocratas a milhares de quilômetros de distância culminava, por um
lado, na perda de soberania da nação britânica e, portanto, do cidadão
britânico que demonstra sua vontade através das urnas; e, por outro, na
transferência do ônus das imigrações aos próprios cidadãos nativos do país
através de uma desigualdade cívica instaurada.
Antigas leis e decretos consagrados pelo
direito consuetudinário inglês e depois tornados lei positiva perdiam força ante
aos tratados internacionais, que decidiam sempre em prol do refugiado apátrida ou
imigrante que não partilhava dos valores nem do estatuto cívico britânico – e,
contraditoriamente, gozava de seus benefícios, mantidos pelos pagadores de
impostos do país, como se, em decorrência de sua frágil condição, constituísse
um grupo acima da isonomia do estado de direito.
Concomitantemente, Scruton estabelece uma
reflexão acerca do Estado de Bem Estar Social, mais especificamente sobre suas
consequências, as quais resume nos dois fenômenos mais observados na Europa: o
aumento crescente da classe de dependentes dos programas sociais e o aumento
também crescente dos custos – e, consequentemente, dos impostos – para mantê-los.
O Estado de Bem Estar Social representava, desta forma, uma encruzilhada
orçamentária e política sem resolução aparente[3].
Ron Paul, pelo mesmo caminho, num artigo
excelente, toca o ponto certo da ferida
construir um muro ignora as
verdadeiras causas de por que as pessoas cruzam ilegalmente as fronteiras dos
EUA. Embora Trump esteja correto em priorizar a questão da segurança interna,
ele erra o alvo: a questão pode ser resolvida de uma maneira mais efetiva e,
principalmente, com um real benefício financeiro para o país — e não com um
enorme custo econômico, como é o caso do muro.
A solução para realmente atacar o problema da
imigração ilegal, do tráfico de drogas, e da ameaça da entrada de terroristas
pela fronteira é clara: remova o incentivo gerado pelos programas
assistencialistas, que nada mais são do que um ímã que atrai várias pessoas a
cruzarem as fronteiras ilegalmente; interrompa as várias intervenções bélicas
americanas no Oriente Médio, que já duram 25 anos; e acabe com a guerra as
drogas, cuja proibição serve apenas para gerar um mercado negro perigoso e
altamente lucrativo, o que incentiva os mais violentos traficantes a cruzarem
as fronteiras[4].
Os
benefícios oriundos da imigração são claros. As principais empresas, de maior
capital no mundo, possuem boa parte de sua mão de obra constituída de
imigrantes e de pessoas de diferentes nacionalidades. Em pesquisa recente
publicado pela University College of London[5], estudiosos conseguem
demonstrar os principais efeitos da imigração sobre uma economia: o
fornecimento de mão-de-obra, o impulso ao consumo e, principalmente, o choque
cultural responsável pelo intercâmbio de tradições e conhecimentos que ao longo
da história humana sempre se demonstrou benéfico, especialmente no tocante ao
desenvolvimento das condições materiais.
O ato de enrijecer as fronteiras à imigração
produz aquilo que denominamos de “reserva de mercado”. Tende a proteger uma
determinada camada de agentes econômicos que, sem enfrentar potenciais
concorrentes, não recebem incentivos para a melhoria de seus serviços. A
entrada de imigrantes, desta forma, além de proporcionar um certo “boom”
econômico, também corresponde a uma forma indireta de produzir melhores
empregos, salários e produtos e serviços de melhor qualidade a preços mais
baixos.
No debate mais mencionado nos últimos dias, o
recente decreto anti-imigração de Trump não somente representa uma tremenda
hipocrisia do próprio presidente, cujas empresas possuem trabalhadores de
diversas etnias e nacionalidades até mesmo em território americano, como, da
mesma forma como apontou Ron Paul, não ataca o cerne, o motivo real da
imigração ilegal.
De forma análoga, contudo, os conservadores
Scruton e May apresentam o outro lado da questão: a imigração, sobretudo
ilegal, e a subserviência de um país inteiro a tratados e organizações
internacionais têm como ônus os próprios cidadãos do país. É impossível haver
uma sociedade livre onde aqueles que deveriam gozar dos benefícios de serem
cidadãos são obrigados a abrir mão de parte de sua soberania em nome de
direitos abstratos tidos como universais. Pior ainda, é impossível haver um
regime estável e sadio onde há distorções causadas pelo ônus das medidas
sociais
Os vários programas assistencialistas
financiados pelos pagadores de impostos americanos e que beneficiam os
imigrantes ilegais que entram nos EUA — como as transferências financeiras
diretas, os benefícios médicos, a distribuição de alimentos, e a educação
pública — custam estimados US$ 100 bilhões por ano. Isso é um fardo
significativo sobre os cidadãos e residentes legais.
A promessa de dinheiro gratuito,
comida gratuita, educação gratuita, e serviços médicos gratuitos para quem
cruzar a fronteira ilegalmente é um poderoso incentivo para as pessoas o
fazerem. Acima de tudo, não faz absolutamente nenhum sentido o governo
americano fornecer esses serviços para aqueles que não estão no país legalmente[6].
Qual seria, portanto, a
coisa certa a fazer? Não há uma fórmula pronta. Existem questões cujas
respostas não podem ser dadas de imediato. Muito menos suas implementações
práticas. Minha sugestão, no entanto, é esta: não é justo que cidadãos
americanos paguem pela estadia de refugiados ou imigrantes ilegais. Também não
é benéfico á economia bloquear a imigração. A melhor saída seria, portanto, enquanto
a imigração é cerceada, reformar ou eliminar os programas sociais, retirar
incentivos e reforçar a soberania americana face a órgãos internacionais como a
ONU, além, é claro, de abster-se de se intrometer em guerras e conflitos
alheios. Resta a Trump proceder com estas reformas para, ao mesmo tempo,
devolver aos americanos o poder sobre seu próprio organismo política e
recolocar o país de volta no caminho da liberdade.
[1] https://www.youtube.com/watch?v=WfxUPnMMIL0&list=PLnyUgjnJZzS5W3GI-iQ9_Y4tVAAN7Uf8A
[2] https://www.amazon.com.br/Como-Ser-Conservador-Roger-Scruton/dp/8501103713
[3] Ibidem.
[4] http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=2622
[5] http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/11/141105_imigra_grana_fd
[6] http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=2622
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