"Quando vejo o princípio de liberdade em ação, vejo agir um princípio vigoroso, e isto, de início, é tudo que sei. É o mesmo caso de um líquido; os gases que ele contém se liberam bruscamente: para se fazer um julgamento, é necessário que o primeiro movimento se acalme, que o liquido se torne mais claro, e que nossa observação possa ir um pouco além da superfície".
Edmund Burke.

quarta-feira, 1 de junho de 2016

O que significa ser um Liberal?





 Muito se diz por aí que o liberalismo é uma doutrina favorável aos grandes conglomerados monopolistas que expropriam as riquezas comuns em prol do enriquecimento de um pequeno número de empresários e credores internacionais, ao mesmo tempo em que um grande número de pessoas fica literalmente à míngua e sente as maiores necessidades em virtude da desigualdade de riqueza produzida por um sistema injusto. 

 O objetivo deste ensaio tem por intenção desmistificar estas e outras mentiras tão repetidas a respeito desta doutrina econômica e social e trazer ao leitor uma imagem mais próxima ao o que de fato constitui o liberalismo em sua versão clássica.

 Primeiramente, o liberalismo é por excelência a filosofia da liberdade. Como tal, seu princípio mais básico diz que cada indivíduo é, por sua constituição intrínseca, livre para perseguir seus objetivos, dispor livremente de suas posses, energias físicas e mentais conforme o próprio entendimento, se expressar nos termos que melhor entender e exprimir aquilo que melhor lhe convém, sem, é claro, interferir na esfera privada dos demais. Portanto, pode-se com toda a certeza afirmar que um liberal é a favor de que todos possam conduzir suas próprias vidas sem padecer de restrições ou coerção de terceiros, sejam estes outros indivíduos isolados ou mesmo uma determinada associação coletiva, sendo, por estas características, iguais perante a lei.

 Em segundo lugar, partindo deste pressuposto central da liberdade para agir, se deve afirmar a inviolabilidade dos direitos individuais face a qualquer interferência externa. A todos e cada um dos indivíduos de determinada comunidade deve ser salvaguardada o direito à própria vida, à propriedade de si mesmo, suas faculdades, pensamento, bens e fruto de seu trabalho e à liberdade para dispor de todos estes fatores conforme a determinação dos próprios planos individuais. Com mais precisão, desta forma, nas definições conceituais, atuar como um liberal consiste em atuar na defesa ardorosa da amplitude dos direitos individuais e da inviolabilidade do indivíduo contra qualquer poder coercitivo.

 Em terceiro lugar, o liberalismo deve ser entendido como uma doutrina individualista – não no sentido contemporâneo do termo, que se refere ao egoísmo e ao relativismo dos padrões – juntamente porque situa a capacidade de tomar todas as decisões sob a égide do próprio entendimento individual. Isto quer dizer, sobretudo, que cada um é o melhor juiz e legislador de si mesmo e das próprias ações. O processo de tomada de decisão, desde a mais simples como escolher entre tomar um copo de água ou um suco de um sabor qualquer até decidir investir tempo e dinheiro em ações da Vale do Rio Doce ou em títulos da dívida pública, implica ponderar conforme uma série de circunstâncias de tempo e lugar circunscritas ao próprio agente que são somente por ele conhecidas e que podem se alterar a qualquer momento. Ser um liberal, neste quesito, significa dentender que os planejamentos e determinações sociais, econômicos ou políticos traçados por tecnocratas em Brasília ou na Câmara Legislativa de São Paulo tendem, geralmente, a falhar e a produzir um resultado distante do esperado em virtude de não possuírem os conhecimentos mais ínfimos e, nem por isso, menos importantes, que explicam os contextos em que cada indivíduo vive.

 Em quarto lugar, a doutrina liberal clássica entende que a cooperação voluntária entre os indivíduos e os fenômeno da especialização e da acumulação de riqueza que dela decorrem é a forma mais eficiente de ajuste das múltiplas vontades humanas, sendo responsável pelos avanços tecnológicos responsáveis pelos ganhos em qualidade de vida que hoje observamos e que podem ainda evoluir muito. A livre concorrência, aliada ao interesse que cada produtor possui em satisfazer suas próprias necessidades, consiste no fator desencadeador da riqueza no mundo ocidental, caracterizada pelo barateamento de bens e serviços e numa maior autonomia individual. Ser liberal consiste também em defender que o mercado e seu sistema de preços informam a cada produtor e comprador as preferências e meios disponíveis naquele dado momento, e que são mais eficientes na sua função de coordenação das ações individuais quanto mais livres da intervenção governamental tendem a ser.

 Em quinto lugar, como conjunto dos preceitos anteriores, deve-se ter em mente que o liberalismo, em suma, age no sentido da máxima limitação possível do poder político e social. Da mesma forma como não possuo nem o direito, nem o poder legítimo – isto é, não baseado na força – de interferir sem permissão nas decisões de outros indivíduos, uma sociedade livre só é possível na medida em que não haja instância superior qualquer capaz de tomar decisões ou escolher por outras pessoas. Para o liberal consciente destes valores, a figura do Estado deve se restringir à sua função de criar e zelar, com o máximo de vigor possível, pelas leis mais básicas e objetivas possíveis que impeçam a coerção e a violação de direitos individuais na comunidade em seu seio, sem haver por isso a necessidade de obrigar prévia e positivamente qualquer um de seus cidadãos a uma determinada ação. As determinações políticas sobre quais são os cônjuges para uma possível escolha, ou qual o tipo de bebida que se pode tomar ou mesmo quando, em qual lugar e que tipo de cigarro se pode fumar, bem como os impostos e sua quantidade são exemplos rotineiros da invasão do poder político na esfera privada e inviolável de seus cidadãos.

 Por fim, em último lugar, o liberalismo não é uma doutrina que advoga em favor desta ou daquela classe, categoria ou setor. Esta escola clássica de pensamento celebra como uma de suas principais virtudes o fato de buscar a maximização de bem estar, partindo da liberdade individual, de todos os indivíduos. Ela não serve a este ou àquele partido, legenda ou luta sindical; ela representa, antes de tudo, o anseio por mais liberdade, econômica e política, de cada um frente aos monopólios que são criados por medidas protecionistas; contra o conluio entre políticos e grandes setores de capital, cujas medidas objetivam privilégios mantidos às custas dos consumidores; face à intervenção ilegítima na escolha de com quem casar-se, com quais ideias e grupos associar-se; contra o excesso de burocracia decorrente de um aparato técnico cada vez maior e mais propenso à corrupção; defronte aos obstáculos à livre iniciativa material e de pensamento, á liberdade de escolha irrestrita e à competição livre; e, principalmente, contra a utilização de recursos públicos para o financiamento grupos políticos apadrinhados que enfraquece, sobretudo, as instituições do estado democrático de direito e o funcionamento de seu regime político.

 Isto, caro leitor, está acima de qualquer intriga eleitoral. O liberalismo da velha escola de John Locke, Mill, Touqueville, Hayek, Mises, Hamilton, Adams é, por tudo isso, um conjunto sólido de valores e ideias que não tem por intenção defender grupos específicos: a liberdade, o livre mercado, a ordem espontânea e a propriedade privada nos trazem incontáveis benefícios, muitos superiores do que qualquer medida governamental tomada em qualquer episódio já observado. Abrace esta ideia, seja um liberal. Você só tem a ganhar.


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