Diante da crise que estamos
enfrentando, uma certeza parecemos ter: apesar da magnitude do déficit
orçamentário e dos problemas econômicos que lhe estão associados, as causas
desta vultuosa instabilidade são bem antigas e conhecidas do público
brasileiro.
Desde os inícios da época colonial, a Coroa
Portuguesa tratou de erigir uma máquina burocrática civilizatória em detrimento
dos costumes e tradições locais. As práticas de colonização sem dúvida trouxeram
aos habitantes locais novidades e benesses do velho mundo, mas findaram, sobretudo,
por constituir uma cultura nefasta que perdura até os dias atuais, cuja
definição inclui termos notórios como o patrimonialismo, espólio e
autoritarismo.
Não é difícil compreender no que consiste, nem
como por quais meios esta cultura ainda está bem viva no nosso meio. Todo o Estado
da época, que mais tarde viria a tornar-se independente – sem perder, contudo,
suas principais características – fora concebido como um poderoso instrumento
de confisco das riquezas produzidas pelas comunidades locais. Riquezas cujo uso
destinava-se à posse exclusiva de um estamento político português que enxergava
nas relações de clientelismo o poder político de atrair novas adesões à
Metrópole além-mar. As antigas prebendas e honrarias concedidas aos corajosos
homens dispostos a servir aos interesses da Coroa, mesmo antes que qualquer
sociedade local houvesse originado leis harmonizadas a sua própria cultura e
história, já evidenciavam os modos pouco honestos de exclusão de rivais e
consolidação espúria de alianças que dominariam a vida política até os dias de
hoje. Em poucas palavras, a utilização dos aparatos burocráticos para benefício
e enriquecimento próprio em detrimento da sociedade civil, aquele patrimonialismo
antigo, apenas se intensificou conforme os anos avançavam rumo aos tempos
atuais.
Com é dito em um artigo formidável (http://theglobalp.com.br/os-audios-de-lula-e-sergio-machado-a-crise-do-antigo-regime-brasileiro/),
o autoritarismo é a outra face da moeda deste sistema tirânico beneficiador de
pequenas elites poderosas. A tentativa de moldar a sociedade civil, seus indivíduos
e as comunidades que lhe compunham, segundo seus próprios interesses e planos
prévios não nos legou somente uma grave crise de representatividade, um
sentimento generalizado de que não há, na numerosa classe política, um só
magistrado com quem seja minimamente possível se identificar. Fez consolidar,
também, a forte opressão sobre os movimentos populares, sobre ideias liberais e
tentativas de reduzir o poder estatal em prol dos interesses legítimos que
germinavam na própria conduta dos movimentos da sociedade civil.
A esbórnia com os recursos do confisco está
longe de ser, portanto, algo atípico. Os gastos crescentes da Coroa apenas
foram substituídos em termos de sofisticação, quantidade e conjunto de
beneficiários. As alianças, as ameaças aos inimigos, o “cassetete da democracia”
naqueles que ousam infringir o status quo também permaneceram. A Metrópole
subsiste – e não é mais em terras além-mar. Subsiste às expensas da ação livre
de muitos indivíduos, contra o empreendedorismo que ajusta as diversas
atividades humanas e dá lugar ao novo, ao inesperado, ao inovador.
Ir às ruas e protestar contra a absurda carga tributária é só um pequeno passo dentro de muitos. Na terra dos Tupiniquins, cabe acima de tudo esclarecer e iluminar-se: à redução do espólio deve seguir-se a negação por mais privilégios e políticas de interesses. A realidade da Metrópole é a tragédia, é o Leviatã brasileiro que tem sua última fortaleza no que restou dos conchavos e dos filhos do populismo. É por outro lado incoerência de certa militância que “morde e assopra”, que onera a todos e clama por tantos direitos quantos são possíveis de conceber. A nova política do novo governo Temer parece não ter nada de novo. Não dará a cada um mais liberdade ou autonomia. É só farsa e fingimento. E concluo com uma nova pergunta: como conquistar uma nova independência?
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