"Quando vejo o princípio de liberdade em ação, vejo agir um princípio vigoroso, e isto, de início, é tudo que sei. É o mesmo caso de um líquido; os gases que ele contém se liberam bruscamente: para se fazer um julgamento, é necessário que o primeiro movimento se acalme, que o liquido se torne mais claro, e que nossa observação possa ir um pouco além da superfície".
Edmund Burke.

quinta-feira, 19 de maio de 2016

Não, os bancos não são "opressores"

  Vocês, leitor e leitora, já devem ter visto postagens, textos variados a respeito da excessiva taxa de juros, da enormidade do déficit público em relação ao valor que realmente se gasta com projetos sociais e a manutenção de serviços públicos básicos, e que a culpa pela necessidade do ajuste fiscal se dá exclusivamente pela ganância dos banqueiros e dos mais variados agentes do setor financeiro. Em todo este discurso falso, conforme se verá, não há nada de novo em relação aos erros que corriqueiramente se cometem quando o assunto é déficit público e taxa de juros.

 Para ir direto ao ponto, não, a taxa de juros, ou o juro em si, não é um preço ou valor que possa ser determinado artificialmente por um órgão restritivo e externo tal como o é a estrutura governamental. Antes de mais nada, os juros consistem na diferença entre um bem econômico presente e outro futuro: resultam primordialmente da interação dos agentes econômicos nos preços de mercado, no qual o juro se define como o preço de mercado dos bens que já se encontram disponíveis para consumo em relação aos bens que ainda não se encontram finalizados. 

 Para esclarecer melhor: boa parte de nós avalia subjetivamente, isto é, confere um valor maior a um produto que possa lhe dar a satisfação imediata (no presente, no agora) de algum desejo/necessidade em detrimento do mesmo bem quando disponível futuramente, enquanto pouquíssimos entre nós estão dispostos a abrir mão de uma satisfação imediata para, digamos, usufruir o mesmo bem ou serviço no futuro. Isto tem uma razão evidente: dado que o tempo é um recurso escasso e não sabemos quais serão as circunstâncias que amanhã estarão presentes, praticamente todos os seres humanos tendem a procurar a máxima satisfação de seus desejos o mais rápido possível. Este fato explica porquê, por exemplo, uma TV ou computador já posto à venda é mais valorizado, e, portanto, mais caro, do que todas as suas peças já unidas mas que, pela ausência de processos específicos de produção, ainda não deram lugar a tais aparelhos.



 À abstenção do consumo imediato para um eventual consumo no futuro damos o nome de poupança, que na economia dos nossos dias nada mais é do que o lastro do capital, a condição que possibilita o surgimento de novos bens de capital e processos de melhoria na produção de diversos bens. Visto que o juro corresponde à diferença de valor entre o bem presente e o mesmo no futuro, numa sociedade em que ampla maioria das pessoas possui uma preferência temporal alta (prioriza o consumo imediato) em detrimento dos escassos poupadores, decorre que os bens futuros terão um valor bem inferior aos bens presentes e, portanto, decorre que a taxa de juros será elevada.  No caminho inverso, no qual a ampla maioria dos membros de uma determinada sociedade possui uma preferência temporal baixa, a taxa de juros será necessariamente menor.

 O leitor provavelmente já terá percebido nesta altura que parece haver uma correlação inversamente proporcional entre a taxa de juros e a poupança. Note que, à medida que o número de poupadores cresce, e que, portanto, aumentam também os investimentos e acúmulos de capital, as taxas de juro tendem a cair. Dizendo em miúdos: num contexto em que os investimentos estão escassos e no qual os agentes encontram dificuldade para acumular capital em decorrência de excessiva carga tributária, regulações e burocracia, os bens futuros sofrem depreciação pela queda vertiginosa de sua demanda. Note também que o crédito, como qualquer outro bem econômico e sujeito ás relações de oferta e demanda dos processos de mercado, tem seu preço ainda mais elevado devido ao fato de 70% de sua oferta ver-se atualmente consumida quase que exclusivamente pela união e os estados federativos, ficando os restantes 30% disponíveis para uma quantidade infindável de pessoas físicas e jurídicas.

 Aqui há esta grande concentração de pessoas que defende o estabelecimento artificial de uma taxa baixa de juros, de maneira a reduzir o déficit público e engordar o montante de recursos destinados à máquina administrativa. Ora, façamos um exercício lógico: se nos últimos anos a expansão creditícia a preços baixos – muito superior em relação à quantidade de poupança que se formou neste período - incentivada artificialmente pelo governo federal foi responsável em grande parte pela desestruturação de nossa economia, quais benefícios uma ação como essa poderá nos trazer?

 A emissão desmedida de moeda, bem como a expansão irresponsável de crédito, não apenas sinalizam erroneamente a investidores e empresários as condições de mercado em determinados setores, como também comprometem a aplicação de recursos e de mão-de-obra nas mais diversas áreas. Daí só pode advir a grande massa de desempregados, principalmente dos setores de bens de produção, e o generalizado aumento de preços. Os verdadeiros vilões da crise são, portanto, o governo federal e suas medidas tirânicas utópicas de supressão da pobreza e combate à desigualdade que, amparados sobre um inchaço tenebroso do seu poder, submete todo o setor bancário a mais opressora obediência quanto à imposição de preços tabelados de subsídios, moeda e crédito. Novamente: não, cidadãos, os bancos não são responsáveis pela irresponsabilidade da União com suas próprias contas. Também não são eles responsáveis pela redução das suas possibilidades de escolha em pleno século XXI.    

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