Com efeito, a ideia, por si só, não deixa de
ser atraente. Num momento em que estamos em uma grave crise econômica, um
eventual cenário de aplicação garantida e geral de renda mínimo aparenta ser um
ótimo remédio para todos os nossos problemas, e é provável que não sejam poucos
aqueles que alimentam, ainda que timidamente, uma ideia semelhante. No entanto,
longe de ser um paraíso, nesse contexto hipotético a recessão e seus sintomas
apenas se agravariam.
Se concebêssemos, por exemplo, uma renda mensal
de R$ 1.000,00 para cada cidadão brasileiro, independentemente de condições
sociais, raça, idade e sexo, teríamos um gasto mensal – considerando o montante
de 200 milhões de brasileiros, população atual segundo o último censo do IBGE
de 2013 - aproximado de 200 bilhões de reais e um total, ao final de um ano, de
2,4 trilhões de reais. Ora, considerando, em valores arredondados para cima, o
PIB de 2015, estimado em 5,9 trilhões de reais, esta cifra constituiria nada
menos do que uma bela mordida de 40% das riquezas geradas nacionalmente.
Num primeiro lançar de olhos, o primeiro obstáculo
para que essa distribuição se realizasse viria com a elaboração dos métodos
institucionais necessários para coloca-la em prática. Além de ser um
empreendimento praticamente impossível do ponto de vista prático, a sua
consequência imediata seria o agigantamento do aparato burocrático de
administração, que já não é pequeno e exigiria um aumento na quantidade de
impostos. Considerando a atual carga tributária, a 14ª maior em todo o globo, teríamos,
novamente num período de doze meses, cerca de 80% do PIB convertido em
impostos. E mesmo se considerarmos o corte de programas assistenciais que
encontrariam suas contribuições contempladas nos R$ 1.000,00 dados a cada
cidadão, a carga de tributos dificilmente se reduziria para menos de 70% do
PIB.
Num momento subsequente, observaríamos uma
queda ainda maior do poder aquisitivo da população. Com mais papel moeda em circulação e,
consequentemente, com uma economia ainda mais inflada, os preços de bens e
serviços subiriam drasticamente, afetando toda a estrutura de produção no país.
A desvalorização do real perante ao dólar se intensificaria; bens de capital,
estimando que as tarifas de importação permanecessem as mesmas, se tornariam
mais escassas e a indústria perderia ainda mais em produtividade. Seu poder de
competição em nível internacional chegaria à zero, com os mesmos efeitos
podendo ser observados nos setores agrícola e de serviços, onde, no primeiro, a
subida de preços dos insumos importados exerceria aqui o mesmo resultado em
termos de competividade internacional e o aumento da oferta interna por
commodities, decorrente da renda mínima, não tornaria mais acessíveis alimentos
que já não o são e impediria o consumo generalizado de outros que são
facilmente obtidos ; e, no segundo, com uma elevação tão drástica de tributos,
micro e médias empresas certamente deixariam de existir, outros empreendimentos
nem sairiam do papel e a concorrência responsável pela inovação e pela queda de
preços se tornaria praticamente inexistente. Outros monopólios ou oligopólios
fatalmente surgiriam, e as regulamentações em cada setor apenas auxiliariam na
consolidação de serviços verdadeiramente ruins.
Em pouco tempo, mesmo com um possível aumento
inicial nos níveis de consumo que poderia aquecer o mercado de contratações, a
evidente falta de mão-de-obra qualificada, aliada aos fatores acima
mencionados, certamente tornaria tudo isto ainda mais insustentável. A taxa de
desemprego voltaria a subir após redução inicial, as taxas de juros chegariam a
um montante ainda mais alto e ao fim e ao cabo, outras medidas
político-econômicas teriam que ser tomadas se se quisesse manter o projeto da
renda mínima.
Veríamos
então uma participação ainda maior do estado na economia, com estatizações e
financiamentos públicos de outros serviços, uma vez que estes se tornaram insustentáveis
para a incipiente produção local. Para lutar contra a inflação, velhas medidas,
como o congelamento de preços e salários e juros, seriam retomadas em conjunto com
racionamentos em nível federal. O resultado não seria nada mais do que a escassez
de produtos básicos nas prateleiras dos supermercados, a fome a miséria. E,
mesmo que a renda mínima neste modelo fosse rebaixada para valores mais
modestos, efeitos tão negativos não estariam descartados.
Em suma, mesmo não podendo opinar sobre um país cujas realidades política, econômica e social desconheço inteiramente, arrisco dizer que o “Não” foi a decisão mais sábia tomada neste plebiscito. E que nossos políticos também se deem conta das consequências nefastas que muitos de seus projetos nos trariam já nos trazem quando colocados em ação.
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