Os graves problemas econômicos que atualmente assolam
o Estado do Rio Grande do Sul e que de forma súbita tomaram as manchetes de
muitos jornais pelo Brasil nos oferecem mais uma oportunidade de exemplificar
quais são as implicações, na vida do cidadão comum, da expansão e do inchaço das
máquinas governamental e burocrática, fenômeno o qual, distante de promover
bem-estar duradouro e anular as desigualdades sócio-econômicas presentes nos
contextos em que atuam, restringe desenfreadamente o âmbito das escolhas
individuais e concorre para o recrudescimento da pobreza e das possíveis
instabilidades institucionais já existentes.
Para contextualizar o leitor, fruto de um acúmulo de déficits e do agravamento da dívida do Estado ao longo dos últimos 40 anos, o eleitorado gaúcho hoje se depara com sua pior crise financeira dentre todo o período de sua existência: com um rombo nas contas públicas que pode chegar a cifra estonteante de R$ 5,4 bi ainda no final deste ano, e com a forte ameaça de calote perante ao Governo Federal, quase todo o serviço público rio grandense viu-se às margens de uma longa paralisação de seus mecanismos de funcionamento, incluindo seus servidores que, em razão do parcelamento de seus salários respectivos ao mês de julho, optam pelo cessar temporário de suas atividades como forma de protesto. Além disso, algo que salta à vista quando nos deparamos com os detalhes de toda esta crise diz respeito, por um lado, à gestão ruim dos recursos captalizados e coordenados pelo Estado, uma vez que praticamente 73% de toda a sua receita é destinada ao pagamento dos servidores públicos enquanto serviços básicos fornecidos univocamente por vias públicas carecem de eficiência e qualidade; e ao anúncio do atual governador José Ivo Sartori, o qual asseverou no último dia 20/08, que submeterá à Câmara dos Deputados do Estado medida que propõe a elevação da alíquota dos impostos sobre a circulação de mercadorias e serviços (ICMS) e sobre a gasolina, álcool, telecomunicações e energia elétrica com a finalidade exclusiva de apresentar soluções e alternativas para esta vultuosa instabilidade.
Como se pode notar, agora, juntamente aos efeitos nocivos oriundos de políticas econômicas nacionais voltadas ao consumo e financiamento de crédito irresponsáveis e à irresponsabilidade fiscal como meio de tentar apaziguar as mazelas sociais da pobreza e da desigualdade, os cidadãos de todo o Rio Grande do Sul vêem-se diante de uma nova restrição em seu poder econômico e social, que, por um lado, diretamente acarreta numa redução de consumo dos itens sobretaxados por parte de uma classe média massificada e numa possível abstenção de consumo destes bens por outra grande parcela da população que ainda minimamente gozava do uso dos mesmos; e, por outro, acarreta na redução da produção e confecção dos mesmos em virtude da queda de seu consumo, o que conduz, necessariamente, a elevação das taxas de desemprego. Como conseqüência, não apenas tais medidas afetam profundamente as camadas mais desprestigiadas do eleitorado gaúcho, que, sem alternativas senão empregar os poucos vencimentos que possuem ao uso de serviços públicos insatisfatórios (ou carecer em absoluto de seu usufruto), tais como saúde, educação, energia e transporte, adoecem maculados por esta deficiência estatal; como, no oposto deste conjunto de cidadãos, os grupos detentores de grandes riquezas permanecerão com seus altos padrões de qualidade de vida.
E a situação pode ainda incorrer em agravo caso, em via oposto às medidas tomadas na urgência do momento – cortes orçamentários através da redução de cargos e funções dentro do inchado sistema público – se decida, pautado sobre discursos de fornecimento indiscriminatório de outros tipos de bens, por uma regulamentação maior ou por uma nova intervenção em setores onde há ainda relativa liberdade econômica, porquanto, ausente o mecanismo impessoal de estabelecimento de preços e quantidades segundo vontades subjetivas livres, não seja factível calcular a real dimensão dos custos necessários e dos ganhos futuramente obtidos, incorrendo, desta feita, na manutenção do déficit público.
Aqui cabe desviar o espírito crítico aos efeitos políticos desta crise e de suas restrições econômicas. Diante de obstáculos como a burocracia, alta carga de impostos, monopólios estatais e a queda de consumo, a livre-iniciativa e a competição entre atores econômicos e políticos tende a esmorecer, enquanto concentrações de renda provocadas pela restrição de consumo sobre as parcelas mais pobres podem conduzir, como já o fizeram em grande parte das situações nas quais fenômenos semelhantes ocorreram, à concentração de meios de veiculação de informação e de subsídios a partidos políticos e ações governamentais, o que certamente resulta no fenecimento do pluralismo político e no agigantamento das operações ilícitas ligadas à corrupção e a manutenção de poder através de ações coercitivas contra fontes de inovação e de novas idéias. Convém aquiescer, para maior consternação diante dos fatos, que esta realidade de déficit estatal e de dívida pública face à união é comum a todos os Estados da federação, que padecem, em maior ou menor grau, do comprometimento de suas receitas (aproximadamente 70%)apenas com o pagamento dos servidores.
Desta feita, esta situação
calamitosa serve-nos como mais um exemplo da redução das liberdades
individuais, valores caros a qualquer regime que se queira democrático, quando coibidos
por uma portentosa maquinaria pública. De forma breve, como desfecho, apenas
citamos uma característica intrínseca ao funcionamento do sistema público em
geral, que aqui se encontrou brevemente analisada: além da ineficácia e péssima
qualidade freqüentes de seus serviços, resulta da concentração de poder em suas
mãos o desperdícios de recursos, a irresponsabilidade fiscal, o espólio das propriedades
dos pagadores de impostos e clemência por mais arrecadação e financiamento
quando seus objetivos não são contemplados, sob a inferência de que faltam
investimentos neste ou naquele determinado setor. E a única forma de entrever
embate contra este mal reside na base de uma sociedade livre: mais liberdade e
poder ao indivíduo.
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