Em resposta às manifestações favoráveis aos
impedimentos do atual mandato da presidente em exercício ocorridas no último
dia 16/08, grupos políticos e sociais favoráveis à manutenção do atual governo tomaram
as principais ruas e avenidas da cidade na quinta-feira, 20/08, como forma de
verbalizar também as suas insatisfações e direcionar críticas à atual oposição
e á forma como a mesma se posiciona face às crises econômica e política.
Como nos apontam os dados apresentados pelo Data Folha a respeito dos grupos e das opiniões presentes nesta manifestação e os diversos testemunhos acerca do conteúdo de suas mensagens políticas divulgados em jornais, blogues e redes sociais, uma de suas características fortemente notórias consistiu na heterogeneidade dos participantes e de suas reivindicações. Segundo as mesmas fontes, grande parte dos presentes, em oposição às manifestações anteriores de 16/08, não possuíam renda elevada nem logravam de moradia em zonas nobres da região metropolitana de São Paulo. Diversas entidades e grupos políticos de destaque nacional ou regional se fizerem presentes, tais como MTST, MST e UNE, além de outros grupos associados a partidos de políticos ou ideais de forte viés socialista.
A despeito da existência de um consenso praticamente geral no que concerne a reprovação de um processo de impeachment contra a presidente Dilma, salvo em caso de denúncia de crimes de responsabilidade ou delitos de igual sordidez (posição esta corroborada também neste blogue no ensaio “Impeachment? Reação Conservadora?”), notou-se com facilidade, porém, forte desacordo dos participantes com as medidas do Planalto atualmente em curso. Aqui cabe destacar, dentre outros fatores marcantes, a reprovação do atual governo por quase metade dos presentes na manifestação, embora houvesse quem se posicionasse inteiramente contra o Partido dos Trabalhadores, independentemente de quem fosse o representante da soberania nacional; contra o atual mandato do poder executivo, inteiramente desalinhado com o discurso eleitoral que antecedera a vitória petista nas últimas eleições presidenciais e com as políticas econômicas e bonança e justiça sociais; contra o oportunismo dos partidos de oposição face às insatisfações populares e a polarização entre PT-PSDB no atual debate da crise política, bem como aos anseios horrendos de restauração ou intervenção militar; ou a favor da manutenção de programas sociais colocados em prática durante os últimos anos de governo petista e que se viram recentemente sob forte ameaça de redução de recursos ou mesmo de extinção.
De todos estes fatos sumariamente expostos acima, fazemos duas observações importantes: é indubitável, primeiramente, que a existência de tais manifestações é saudável a um regime democrático na medida em que coletivamente (ou mesmo individualmente, no caso de uma manifestação ou crítica de um só indivíduo) dá voz e representatividade aos mais diversos setores que compõem a sociedade civil. A liberdade concedida à pluralidade de opiniões e à manifestação das mesmas, a livre reunião de indivíduos em prol de objetivos em comum e a possibilidade de desacordo face às posições de outros cidadãos, das inúmeras entidades políticas ou do próprio governo estabelecido é condição essencial ao florescimento de uma sociedade livre e em geral indicam a solidez ou o processo de solidificação das instituições que conferem sustentação a democracia. No entanto, é deveras válido ressaltar o fenômeno, particular às democracias de massa onde se corre a concorrência de partidos, a hierarquização de movimentos sociais e políticos e a conseqüente monopolização dos estratos sociais mais próximos. Em contradição com os anseios apaixonados de igualdade e soberania popular, praticamente todas estas associações padecem da hierarquização, ainda que não formal, de suas estruturas internas, nas quais uma grande parcela de seus integrantes parecem agir em consonância ao o que é promulgado ou ditado por uma cúpula ou representante da agremiação, onde a habilidades da liderança política e da condução de objetivos e estratégias elevam o indivíduo que o possui e um patamar de legitimidade desigual face a seus demais integrantes. E justamente neste fato reside o poder de monopolização das insatisfações populares através da canalização das vozes dispersas e perambulantes de uma grande massa desconhecedora dos caminhos pelos quais enveredar e das atitudes a tomar, o que faz gestar na última um sentimento de identificação e quase servilismo às propostas propaladas por um “órgão central”. Dito de outro modo, no que concerne ás manifestações dos últimos dias, deve-se ter a prudência, ao analisá-las, de tentar diferenciar o discurso cegamente difundido por movimentos sociais e políticos (ou mesmo partidos) das opiniões legítimas de cidadãos descontentes que podem não encontrar representação através destes meios. Com sabedoria, não se deve descurar da força de agregação e condução de grupos tais como MST, MTST, nem se deixar esquecer que as mesmas observações encontram validade nos movimentos e nas manifestações favoráveis ao cessar abrupto do atual governo executivo.
Em segundo lugar, mas com relevância não menos importante no que tange aos acontecimentos recentes da política, denota-se, em grande medida, uma insatisfação e conseqüente perda de apoio por parte do Partido dos Trabalhadores de grupos e entidades que ardorosamente lhe costumavam conceder apoio e motivação às medidas promulgadas. De fato, antigos aliados, como MTST e UNE proclamaram a bom tom a reprovação com o atual estado de coisas, principalmente com o chamado desvio dos princípios de um governo notadamente orientado aos interesses sociais e populares. Mais uma vez, aqui se faz presente a circunstância que denuncia o atual estado de perda geral de apoio popular do qual se encontra enfermiço a atual presidente Dilma Roussef. O estremecimento de antigos e impávidos braços companheiros faz ressaltar ainda mais, faz decorrer ou decorre (d)a inabilidade política de liderança e diálogo de nossa presidente com a oposição e com as bases aliadas nas Casas do Legislativo, que se associa fortemente ao desvanecimento da necessária personalidade política com acentuado poder de influência e capaz de levar a cabo as medidas promulgadas ou concatenar os próximos passos de uma gestão previamente planejada. Como conclusão, portanto, resta acautelar-nos com a moeda que se nos apresenta o fluir dos acontecimentos: por um lado, o otimismo face ao desgaste de um estilo de dirigismo central e planejamento econômico que põe em risco nossas liberdades e enfraquecem as conquistas individuais obtidas; e, por outro, a incerteza política do advir, que apresenta possibilidades desagradáveis de retomada da destinação de vultuosas parcelas do tesouro público a medidas assistencialistas e/ou o reforço das medidas de intervenção e regulação estatais na vida do cidadão, ameaça sempre constante no horizonte deste regime político. Resta, assim, torcer e agir para que os próximos acontecimentos concretizem mudanças futuras intencionadas a expansão dos poderes do indivíduo e à sociedade livre.
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